Quase sem luz, apenas o som dos carros correndo e com isso vinha o barulho das ambulâncias que nessa época do ano já era até comum de se escutar pelas estradas da capital.
Brasília nunca parou de crescer, o ritmo frenético tornou-se algo comum nas principais cidades do Distrito Federal e eu permaneci aqui por tempo indeterminado, mesmo não conseguindo gostar de tudo isto.
Não tinha um assento disponível para mim, porém, não significava que eu pudesse estar desconfortável. A distração era uma grande aliada nos momentos de tédio. A paisagem fazia com que aqueles momentos fossem mais suportáveis, inclusive, observar os carros e as pessoas que tinham dentro de si era uma das melhores cenas que eu contemplava no dia. Famílias, casais e muitos deles que estavam sozinhos, todos e cada um deles, contidos dentro daquelas cabines apresentavam pequenas cenas fascinantes de se “espionar”. Uma família com trigêmeos; um casal a ponto de desenvolver uma DR; uma mulher cantando alto e desafinando, mas a sua dor era maior que a sua vergonha alheia, já diziam que quem canta os seus males espanta – mas ela também devia espantar qualquer um que a visse agindo daquele jeito; entre outras cenas comuns e incríveis ao mesmo tempo.
A minha viagem mental teve uma leve interrupção quando uma moça diante de mim se ofereceu para levar a minha mochila. Fiquei constrangido, ela parecia disposta a facilitar a minha volta para casa, só se o meu orgulho pesasse mais que sua boa vontade. Pensei em negar e ser cavalheiro, só que aquele peso… Aquela oferta irrecusável daria um pequeno alívio às minhas costas. Acabei aceitando.
A senhora de meia idade, que parecia inquieta após desfrutar uma boa soneca, levantousse e saiu do seu lugar apressada e quase que levava a moça junto, certamente ela já tinha perdido a sua parada. A jovem prefeiriu ceder o lado da janela e ela ficou no corredor, o que era uma vitória para mim no meio de um ônibus cheio: ganhei a oportunidade de estudar a paisagem confortávelmente.
Mas isso acabou sendo um grande inconveniente. Logo depois, pude presenciar um dos piores acidentes que já vi, enquanto o nosso ônibus passava com certa lentidão na via em direção oposta, minha expressão de espanto era a mesma estampada no rosto de cada um dos passageiros. De repente, senti as lágrimas escorrendo pelo meu rosto até a minha barba.